30.6.07
29.6.07
Tiques
Atente-se nos casos do professor Charrua e da directora do Centro de Saúde de Vieira do Minho: o poder não gosta de quem o amesquinha. Em democracia é regra mais ou menos oficial que as brincadeiras, de mau gosto e tudo, tem que ser levadas, bem... Na brincadeira. Não é o que se tem passado com este executivo socialista, que a críticas menores e jocosas responde com processos, despedimentos e exonerações. Velhos fantasmas, vindos dos anos pré-1974, agigantam-se. Os tempos não são os melhores. Não são.
Etiquetas: impressões
Estéticas da morte #vinte e quatro
Lembrei-me do momento, definitivo, em que J. estugou o passo para diante. E de como tentou ainda dar um passo atrás, quando o abismo era já uma certeza a despedaçar-lhe o corpo.
Etiquetas: Estéticas da morte
28.6.07
Amélia
Chama-me Amélia. Podia chamar-me Anabela ou Rosália, desde que fosse um nome estúpido que normalmente designa uma pessoa estúpida. Vivo num 14.º andar e vivo sozinha se pensarmos que um cão não conta como mais um. E portanto sou só eu e mais ninguém, daí dizer que vivo sozinha num 14.º andar, apesar de viver com um cão. Não sou muito feliz, não sou muito triste. Vivo no fio da melancolia. Sou o destino de todas as outras pessoas, conto vitórias por falta de comparência. Aproveito o sol no declinar das tardes. Acompanho geografias, cimento afectos ao longo do meridiano. Vivo num 14.º andar, tu já o sabes. Tu foste meu nas alturas desse dia.
Etiquetas: devaneios
26.6.07
Greek music #fifty seven
The Whitestripes - I Just Don't Know What To Do With Myself
[I need your sweet love to beat love away]
Etiquetas: Música
25.6.07
Things happening
O silêncio tocado dos dedos. Os jogos de peito. O meneio ébrio das palavras. A devassa favorita. O abandono do descampado.
Etiquetas: devaneios
24.6.07
22.6.07
Adorar o diabo

Entre Dezembro de 2006 e Março de 2007, os Diabo a Sete deslocaram-se ao Porto para realizar as gravações de Parainfernália, o seu primeiro trabalho discográfico. Editado pela Açor, o álbum conta com doze temas que balançam entre as referências à tradição musical portuguesa e as incursões por territórios mais modernos. Com promoção do Ateneu de Coimbra, a apresentação será dia 22 de Junho no Teatro Académico Gil Vicente. O espectáculo contará ainda com a presença dos Rebimbomalho, grupo de percussões do Ateneu de Coimbra, que irão encaixar a sua habitual "festa ritmada" num dos momentos do concerto.
Etiquetas: Música
Castelo proibido #dois
Se Cidade Proibida, do blogger Eduardo Pitta, é já o romance gay canónico da literatura portuguesa, Mulheres de Charles Bukowski, publicado em 1978, é um dos clássicos do romanceiro heterossexual hardcore. Sem meneios estilísticos ou concessões linguísticas, Bukowski descreve de forma grotesca as fodas, as bebedeiras, os poemas, os corrimentos, os vómitos e as festas que vão ataviando a pouco gloriosa vida de Henry Chinaski – alter-ego de Charles –, escritor perdido no meio de 17 mulheres, que ele ora fode, ora repele com caretas de enjoo. Nenhuma cedência à ternura, ao amor, à melifluidade. Em consciência é impossível a relativização, o amoralismo: Chinaski é daqueles que apenas suporta a metamorfose dos dias num mundo de papel e palavras.
[Charles Bukowski. 1978 (2001). Mulheres. Lx: Dom Quixote]
Etiquetas: Charles Bukowsky, Eduardo Pitta, literatura
21.6.07
Castelo proibido
Em Cidade Proibida, Eduardo Pitta pinta um retrato vívido e expressivo da homossexualidade no mundo cerrado e [apicalmente] preconceituoso da classe alta portuguesa. Numa linguagem terna e eivada de ironia, entremeada não poucas vezes de uma crueza pouco menos que licenciosa [mas em que o verbo foder, por exemplo, é usado de maneira tão normal e irrepreensível como na famigerada proposição inicial de Teatro de Sabath, de Phillip Roth: “Ou deixas de foder outras ou está tudo acabado”], Pitta sublima uma certa desesperança crescente das personagens, que culmina com o afastamento inopinado e absoluto de duas das figuras cardinais do romance, Rupert e Martim. O que era um retrato transfigura-se enfim numa natureza morta. Eduardo Pitta não se coíbe de dar um forte pontapé na barriga dos leitores, que por momentos deixam absolutamente de crer no amor, seja ele hetero ou homossexual. Nesse sentido, Cidade Proibida – que, por vezes, se torna refém de alguma normopatia e estereotipação da cena gay upper class: do computador Mac ao pólo Zegna, passando pelas leituras de Hawthorne – é verdadeiramente um romance de desencanto em relação ao amor. O que é estranho, tendo em conta o pouco que conheço da biografia do próprio autor. Pitta parece dar razão simultaneamente a Proust e a Sainte-Beuve. Uma derradeira nota. Li em simultaneidade [parcial] Cidade Proibida e The Castle in the Forest [Norman Mailer]. Em comum: a escrita elegante, o enredo cuidado. E, sobretudo, uma visão do mundo completamente apartada de maniqueísmos. Se lerem estes dois belos livros perceberão porquê.
[Eduardo Pitta. 2007. Cidade Proibida. Lx: Quidnovi]
[Norman Mailer. 2007. The Castle in the Forest. NY: Random House]
Etiquetas: Eduardo Pitta, literatura, Norman Mailer
20.6.07
Actio arbitraria
Pôs-se à janela, a caçadeira em abraço, e disparou sobre todos os que por ali passaram. Nenhum tordo nival lhe escapou.
Etiquetas: devaneios
O cobrador
Fodemos.
Ela agora está dormindo.
Sou justo.
[Rubem Fonseca, 64 contos de Rubem Fonseca, pág. 276]
Ela agora está dormindo.
Sou justo.
[Rubem Fonseca, 64 contos de Rubem Fonseca, pág. 276]
Etiquetas: citações, literatura
19.6.07
O anónimo dos comentários
É interessante e preocupante [ou vice-versa, como queiram]. Mas porque me preocupa mais do que me interessa não vou perder muito tempo com isto. A saber: a proliferação nos blogues dos comentários anónimos, algumas vezes caluniosos, a maior parte das vezes pouco informados [para não dizer pouco letrados], também moralistas e jesuíticos. Quem é este anónimo tentacular, omnipresente e omnisciente? Quando tento responder à minha própria questão [às vezes não tenho nada mais importante para resolver] penso logo, em primeiro lugar, num gajo invejoso. É isso, o anónimo é quase sempre um gajo invejoso, alguém eivado de um sentimento de desgosto pela alegria de outrem. A invidia quase sempre desencadeia uma pulsão de dizer mal do invejado. E este anónimo - e invejoso - normalmente diz mal escrevendo mal. Em mau português e de dedo em riste: um epígono fraquinho dos inquisidores-mores. É óbvio que isto me preocupa, que me interessa. Preocupa-me mais do que me interessa. Afinal, não tenho caixa de comentários e sou um bocado egocêntrico.
Etiquetas: blogues
18.6.07
Juízo final
Fez muito frio naquele ano. Eu ainda nem sabia que ela existia. Mais tarde apareceu a criança, feita vergôntea de abraços. Seria em vão. Fez muito frio no ano que se seguiu. Não haveria tempo para as flores da reconciliação.
Etiquetas: devaneios
15.6.07
[Falar mais da patologia]
Assim mesmo, entre parênteses. Não é propriamente uma novidade, antes uma coincidência. Uma página que se abriu e, sem ademanes, a epifania. A revelação da pele submergida no oblívio. Falar mais da patologia. A petição inconformada das palavras. A patologia é conhecida, realizei a anamnese e concluí que dificilmente é curável. Os sintomas são vastos e conhecidos. As curas bem sucedidas: poucas e dificilmente comprovadas pela ciência. Mas não é isso que interessa realmente. O caminho é falar dela, nomeá-la e descrevê-la com frases inteiras. De preferência frases que não façam qualquer tipo de sentido.
Etiquetas: devaneios
14.6.07
O castelo na floresta
A dada altura em The Castle in the Forest, o narrador Dieter [não menos que um demónio clássico, preceptor incorpóreo e reservado da mente de Adolf Hitler] conjura directamente o leitor: “I feel the need to soothe what might be a growing uneasiness in the reader. Good readers are an unprotected species – their allegiance moves in advance of their judgment. Some may felt uncomfortable, therefore, to discover that they are enjoying these first successes of the child, Adolf Hitler. Be assured”. Portanto, até aqui, página 113, tudo bem: suspension of disbelief, Coleridge e mais não sei o quê. No derradeiro parágrafo da página, um demónio [mauzinho] recorda-nos que Adi há-de vir a ser o führer Adolf Hitler, um dos maiores – se não o maior – cabrões da história. Béu. Coração a palpitar, ligeira enxaqueca, alguma azia, leitura mais ou menos estragada. A custo lá se ganha coragem [um copo de licor Beirão ajuda], lê-se mais um pouco e deseja-se muito mal ao pequenito Adi. Só que o filho da puta [mentira, Klara era uma freira devotada a Alois Hitler] do miúdo não morre nem por nada. Be assured.
[Norman Mailer. 2007. The Castle in the Forest. NY: Random House]
[Norman Mailer. 2007. The Castle in the Forest. NY: Random House]
Etiquetas: Adolf Hitler, literatura, Norman Mailer
Borda d'água
As sementeiras do mal são favorecidas pelas chuvas tardias de Junho.
Etiquetas: devaneios
13.6.07
O pátio inacessível
As paredes não são tão frias como dizias, acho mesmo que o papel de parede as torna parecidas com o teu corpo: há uma desarrumação de cores, uma espécie de odor crestomático na tua face, que denuncia a arrogância de um beijo que nunca foi dado. Desejo, imagem plasmada no âmbar de milénios, gruta seminal intocada [mãos humanas, de ocre]. Nada é tão frio como dizias se um dia houver tempo.
Etiquetas: impressões
Ad aeternum
Apercebi-me que vivo dentro de um livro. O meu corpo não é mais que um parágrafo. A minha biografia não tem direito a um capítulo inteiro, sequer. Mas um capítulo, vendo bem, é mais do que tem a maioria dos homens. Alguns têm direito a duas linhas no obituário do jornal, outros nem isso. Uma fotografia sobre o mármore é a única coisa que resta, a maior parte das vezes. Esses são aqueles que se furtam à rasura e se acolhem na memória de algo. Palavras, fotografias, um neto que persiste em perguntar pelo que desapareceu. Mas tudo isso é em vão, tudo é um destroço futuro face ao tempo, à eternidade. Face ao nada que nos apaga inexoravelmente.
Etiquetas: impressões
12.6.07
Assim
O cinzento pontuado de azul cobre as salas que esfriam. Remanesce o sorriso depois das palavras. Há algo mais, pressentimento. As desavisadas costas, o enfado submisso do homem que faz por trabalhar mais um pouco. Uma tarde destas será menos confusa, confundida na força de amplexos roubados ao tempo.
Etiquetas: devaneios
11.6.07
Leves sinais do finito
Os dias: ou são longos ou demasiadamente curtos. No final, a extinção. Transitoriedade forçada. Para quê o esforço? Para quê a criação de sentido? Comodidade, conformismo.
Etiquetas: devaneios
10.6.07
6.6.07
Um jogo de tabuleiro
Sob os pés uma mesa de pó e ao longe algumas flores encarnadas, talvez papoilas. Concentração, destemor, avanço [um grave erro entre parênteses]. Espera. Desilusão. Rei caído.
Etiquetas: impressões
Não foi aquela a resposta
Se um dia houver que seja mais longo será um dia destruído pelo que fui de mal. Redenção fácil esperada. Outrora, naquele dia passado, procurei um mau desvio; perdoa eu não ser mais que um homem [Ruy Belo, O problema da habitação]. Ilumina-me vagamente um sentimento de perda. Prefiro o sofrimento pelo que há-de, pelo que pode ser.
4.6.07
Ela-não-é-francesa-ele-não-é-espanhol
A armadura solitária do insecto. A terra contando os dedos. Depois da morte, sabem-no bem, o nojo é tradição. Uma espécie [de magazine?] de imperativo social: limbo a negro. Nem o que foi, nem o que vai ser. É uma coisa assim assim. A modos que. Não sei explicar bem. Dizia ainda antes que a queratina é a armadura solitária do insecto. Escudo fraco perante a mão forte e rápida de alguém desperto. Daí a morte dele, do bicho insecto. E depois o nojo, o luto, por quem de direito. Ou não, que aquelas famílias são disfuncionais e de parco afecto. A única coisa que lhes invejo são as asas para poder pousar em qualquer sítio.
Etiquetas: devaneios