Passeio Público
(Por Coimbra)
“Por Coimbra não vai nada, nada, nada? Mas mesmo nada? Tudo!” Parece slogan eleitoral (e para isso foi recentemente amputado) mas a história destas palavras é mais antiga, e eleva-se definitivamente sobre as futilidades insistidas nos cartazes de campanha. Estas palavras pertencem à academia de Coimbra (se é que se pode falar de pertença e posse) e não, como parece ocorrer a alguns, ao indivíduo A ou ao partido B.
De facto, a realidade parece opor-se a este postulado fundamental. A utilização de uma parte da expressão relacionada com um dos gritos tradicionais da academia (a saber: “Por Coimbra”) pela candidatura de Pina Prata motivou uma queixa à Comissão Nacional de Eleições por parte da candidatura do PSD/CDS/PPM. Carlos Encarnação e a sua equipa insinuam-se como os legítimos senhores de tão populares palavras. Afinal, usam-nas em campanha desde 2001. Justifica-se a sua propriedade por usucapião: o uso fixa o dono.
Carlos Encarnação e Pina Prata disputam algo que não é pertença de nenhum dos dois. Não o fazem por falta de imaginação ou plágio (o chavão já havia sido utilizado pela candidatura de Mendes Silva, pelo Partido Socialista, em 1982) mas porque partilham a mesma concepção política para Coimbra. Porque apesar de inspirarem posições antagónicas são fundamentalmente iguais.
O que fazer com as palavras? Que as palavras interessam já o havíamos dito, mas talvez possamos pendurar a esse lugar-comum ainda um outro: as palavras revelam ao mesmo tempo que ocultam. Esta é, seguramente, uma trivialidade paradoxal mas justa. O significado veiculado pelas palavras é fluído e poroso, impreciso e vago, carcomido incessantemente pela mudança de interlocutores e interpretações.
No entanto, alguma coisa permanece imutável no caos da comunicação, passível de ser escrutinada e comentada. Coimbra não precisa destes gémeos desavindos mas de uma verdadeira alternativa de esquerda. A responsabilidade de trazer a política a sério para a campanha cabe agora ao Partido Socialista, ao Bloco de Esquerda e ao Partido Comunista.
(Ontem, 18/09, no Jornal de Notícias)
Etiquetas: Academia, Coimbra, democracia, jornais
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