O algar ou a esperança intérmina
Era escuro e bafiento. No chão oculto pelo negrume imperecível senti os despojos do passado: ossadas de animais de grande porte [mamíferos com certeza], uma enorme carcaça cúbica irradiando um frio metálico, talvez uma velha máquina de lavar roupa, cagadelas várias tapadas pudicamente com papel amarelecido [cor associativa, eu não vi, no escuro da caverna, aquela cor. Só que a semiologia faz parte de mim] e sobretudo madeiras podres. Foi junto a uma pilha de tábuas de pinho [madeira associativa, para mim poética] que me decidi. Num trejeito célere, congénito, libertei a água mesclada com ureia em doses conhecidas pelos químicos e naquele ponto, o único ponto fixo do universo [as minhas pernas balanceavam de tal forma que naquele momento eu era o pêndulo de Foucault], decerto se remeteu a imaginação dos espectadores [se os houvesse] para as comportas abertas da barragem de Assuão. No próximo ano voltarei ao ponto. A razão, talvez do caos a vida. A esperança de ali ver uma flor.
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