Passeio Público
(Estação tonta)
É Verão. É um facto. O calor ataráxico, a letargia insuportável das tardes, a ânsia de água fresca acertam os tempos em que nos movemos (pouco e à sombra, preferencialmente). É Agosto. Um salto desafinado. Um criador de desertos.
A crise económica revela-se insuficiente para conter o êxodo. O mar é um termo desejado. Um rio, uma piscina, uma poça de água – Agosto é uma indisposição temporária e os remédios que o distanciam são muitos. Ainda bem. O mês de Agosto não faz bem à saúde e ficar na cidade ainda menos.
As árvores cansam-se da solidão forçada. A Praça da República esquece as caras dos seus cidadãos. A velha Universidade observa a retirada estival dos estudantes (é fácil ser jovem e fugir para longe) e, obstinada, ensoberbece-se à vista de dois ou três turistas mais resilientes. No pinhal de Marrocos, os incêndios do passado são apenas um verde de ocaso. O Mondego foge definitivamente para os areais da Figueira. Coimbra desiste das suas mulheres e dos seus homens. Deixa-os partir para um sítio qualquer: um lugar presumível, longínquo e a tocar a água.
É Agosto, é assim em todo o lado. No Porto, em Lisboa, em Paris e em Londres. Porque não em Coimbra?
As ruas da cidade soçobram de uma vez por todas perante o torpor de Agosto e da canícula das férias. O tempo para pensar dilata-se indefinidamente mas, informa-nos o mais iluminado cliché, a estação é tonta. Na precipitação da fuga as pessoas crêem irreflectidamente nos discursos reiterados e insistentes. Se o Verão é a «silly season» é porque quase toda a gente acredita nisso. A praia é a única opção possível para a justa vilegiatura dos conimbricences: os dias cálidos e sanguíneos de Agosto solicitam a frescura da água do mar.
No Verão, a comida é leve, a música é ligeira e a literatura é «light». Talvez, mas os dias são longos e há tempo para fazer tudo. No recato contente da praia, podemos beneficiar da leitura, por exemplo, da obra maior de Robert Musil, «O homem sem qualidades». Ou permear o romance mais recente de valter hugo mãe, «o apocalipse dos trabalhadores». Se o calor for excessivo passam-se as férias nos arredores da fresca Moscovo («O primeiro amor», de Ivan Turguénev). A brevidade narrativa (e uma maçã) cai sempre bem entre dois banhos de mar: «Histórias de amor» (Robert Walser) ou «Caravana» (Rui Manuel Amaral) cumprem essa lição substantiva.
Entretanto, Coimbra parou mesmo. É assim há muito tempo. Não culpemos Agosto por isso.
É Verão. É um facto. O calor ataráxico, a letargia insuportável das tardes, a ânsia de água fresca acertam os tempos em que nos movemos (pouco e à sombra, preferencialmente). É Agosto. Um salto desafinado. Um criador de desertos.
A crise económica revela-se insuficiente para conter o êxodo. O mar é um termo desejado. Um rio, uma piscina, uma poça de água – Agosto é uma indisposição temporária e os remédios que o distanciam são muitos. Ainda bem. O mês de Agosto não faz bem à saúde e ficar na cidade ainda menos.
As árvores cansam-se da solidão forçada. A Praça da República esquece as caras dos seus cidadãos. A velha Universidade observa a retirada estival dos estudantes (é fácil ser jovem e fugir para longe) e, obstinada, ensoberbece-se à vista de dois ou três turistas mais resilientes. No pinhal de Marrocos, os incêndios do passado são apenas um verde de ocaso. O Mondego foge definitivamente para os areais da Figueira. Coimbra desiste das suas mulheres e dos seus homens. Deixa-os partir para um sítio qualquer: um lugar presumível, longínquo e a tocar a água.
É Agosto, é assim em todo o lado. No Porto, em Lisboa, em Paris e em Londres. Porque não em Coimbra?
As ruas da cidade soçobram de uma vez por todas perante o torpor de Agosto e da canícula das férias. O tempo para pensar dilata-se indefinidamente mas, informa-nos o mais iluminado cliché, a estação é tonta. Na precipitação da fuga as pessoas crêem irreflectidamente nos discursos reiterados e insistentes. Se o Verão é a «silly season» é porque quase toda a gente acredita nisso. A praia é a única opção possível para a justa vilegiatura dos conimbricences: os dias cálidos e sanguíneos de Agosto solicitam a frescura da água do mar.
No Verão, a comida é leve, a música é ligeira e a literatura é «light». Talvez, mas os dias são longos e há tempo para fazer tudo. No recato contente da praia, podemos beneficiar da leitura, por exemplo, da obra maior de Robert Musil, «O homem sem qualidades». Ou permear o romance mais recente de valter hugo mãe, «o apocalipse dos trabalhadores». Se o calor for excessivo passam-se as férias nos arredores da fresca Moscovo («O primeiro amor», de Ivan Turguénev). A brevidade narrativa (e uma maçã) cai sempre bem entre dois banhos de mar: «Histórias de amor» (Robert Walser) ou «Caravana» (Rui Manuel Amaral) cumprem essa lição substantiva.
Entretanto, Coimbra parou mesmo. É assim há muito tempo. Não culpemos Agosto por isso.
(Ontem, 06/08, no Jornal de Notícias)
Etiquetas: jornais
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